Blog elaborado para compartilhar as reflexões da disciplina "Tendências Contemporâneas de Currículo", parte do programa de Mestrado em Ensino de Ciências da Universidade Federal de Itajubá (MG).
E esse foi um semestre muito produtivo! Poder trocar ideias e compartilhar nossas reflexões através do blog foi uma ótima experiência.
Durante a disciplina pudemos repensar nossas concepções de currículo e, mais do que isso, repensar nossas concepções do que é ENSINAR, do real papel do professor e da importância de definirmos nosso POSICIONAMENTO frente ao que nos é apresentado na escola e na sociedade.
A mudança começa quando refletimos sobre nossa prática. Enxergar que precisamos de constante transformação (de milho para pipoca!) é o primeiro passo. Depois, devemos lutar por currículos mais coerentes, que tenham o aluno como centro de toda prática... se decidirmos que queremos ser professores "libertadores", que proporcionam ao estudante conhecimento, valores e autonomia, não será difícil contaminar nossos colegas... quem sabe assim não se inicia uma revolução na educação que temos hoje?
Vendo-me agora como aprendiz, creio que participei da disciplina de forma muito satisfatória. É claro que, diferente da maioria de meus colegas, não tenho uma trajetória de experiências para compartilhar, mas ainda assim expus minhas opiniões acerca da educação a partir do que vivenciei brevemente como docente e, principalmente, do que presenciei como estudante.
Espero que as postagens desse blog tenham contribuído, mesmo que só um pouquinho, para uma reflexão maior que busca sempre melhorar, crescer e transformar!
Entender que a avaliação é um processo complexo, que não se limita a testes e números, é o primeiro passo. Depois disso é ainda necessário compreender que avaliação e currículo devem estar intimamente ligados, em sintonia, desejando os mesmos resultados.
O professor que planeja o processo de avaliação em coerência com os objetivos curriculares preocupa-se em acompanhar a aprendizagem do aluno dia a dia, conhecendo suas dificuldades, apresentando-lhe desafios. As provas e as notas servirão apenas como instrumentos da avaliação maior.
Quando avaliação e currículo comunicam-se, o aprendizado do aluno é o centro da práxis docente.
Na sociedade atual é cada vez mais comum ouvirmos discussões acaloradas que colocam em voga a relação da educação com o trabalho. Entendo que o movimento natural da escola, nesse contexto neoliberal em que vive, é ser influenciada a ponto de trilhar caminhos que façam da educação um processo repleto de metas, estatísticas e índices de qualidade...
... entretanto, não vejo esse caminho como o melhor a ser trilhado. A educação que prepara para o trabalho coloca de lado o indivíduo e tira dele a autonomia no processo. Ela busca atingir metas que mostrem ao mundo exterior o quão boa esta ou aquela escola é, mas isso não leva em conta um aprendizado realmente significativo.
Além disso, o objetivo do ato de educar se perde, se desvia. Não se busca mais o conhecimento, a compreensão do mundo, o saber autônomo; a busca é por números satisfatórios naqueles índices que determinam qualidade. E ensinar, então, se limita a preparar os alunos para um bom desempenho nos exames avaliativos. Vamos gerenciar o ensino para atingir a qualidade total!
A educação para o trabalho é um erro. Uma fantasia sem final feliz.
Outro dia estávamos falando de teorias críticas de currículo e alguém (é claro que foi ela) começou a falar sobre bolo. Isso mesmo, BOLO, aquele fofinho e doce que a gente come com café. No contexto das teorias críticas, você não percebe que tem TUDO A VER??
E então veio uma reflexão profunda sobre bolos industrializados, bolos que perderam a humanidade! Bolos que perderam a magia de serem carinhosamente preparados pra visita da tarde...
Até as vovós perderam a vez do bolo!
E é claro que estendemos essas discussões para o currículo (senão seríamos apenas alguns malucos falando coisas desconexas). Surge então o ponto: assim como o bolo, que hoje não é mais feito com amor pela vovó, o currículo corre o risco de ser "industrializado", embalado à vacuo. Isso quer dizer que a humanidade do currículo, no bojo do neoliberalismo, é deixada de lado. O SUJEITO dá lugar à META, à produção em massa, à formatação universal.
Vítima dessa visão globalizada, o currículo não é feito para os sujeitos, mas para atingir objetivos educacionais pré-definidos. Perde-se a criticidade, a mediação, a reflexão da práxis...
As teorias críticas aparecem, então, como um contraponto necessário. Vamos pensar QUEM, e não "o quê" ou "para quê". A educação não é neutra, é política, não pode ser homogeneizada - o currículo pensa os sujeitos e suas DESIGUALDADES. Nessa tendência, ele visa desenvolver a criticidade do indivíduo e considerar suas condições sociais, históricas e culturais.
Esse currículo é o bolo da vovó!
Não podemos engolir essa ideia de que o currículo é uma receitinha para alcançar as metas. Vamos mesmo continuar consumindo esse conceito embalado à vácuo?
( Pra quem ficou a fim, a receita do bolo de cenoura tá aqui, ó! )
Depois de muita discussão sobre as pontes entre o texto de Rubem Alves e o Currículo, colocamos no papel nossas ideias. Todas elas foram reunidas num desenho, criado pela nossa colega Glenia Medeiros.
Após a leitura de "Pedagogia da Autonomia", muitas ideias relativas à uma educação "libertadora" se tornaram mais claras e palpáveis. Em aula, as discussões foram ainda mais esclarecedoras.
Arrisco-me então a falar dessas ideias freireanas do que é o educar.
Enquanto docentes, devemos pensar nossa prática não como transmissora de conteúdos, mas como um ato de mediação, uma tentativa de estabelecer conexões entre o educando e o conhecimento. Para tal, é necessário uma reflexão intensa sobre o significado do "educar". Se vamos nos despir do autoritarismo, deixar de lado a atmosfera do domínio (seja do saber, seja dos próprios alunos), devemos refletir sobre o que, então, nos tornaremos. E na decisão de uma mudança, nos tornamos uma ponte entre o aluno e o saber, orientando caminhos, despertando no indivíduo a curiosidade [epistemológica]. Trocamos o autoritarismo pela autoridade - valorizamos o aluno e o que ele traz como bagagem.
O educar, nesse viés, se modifica: o ato se traduz em um diálogo que permeia a construção do conhecimento e que também transmite valores e ideais. O docente se preocupa também em formar seu alunos sujeitos críticos, aptos para tomar decisões conscientes em seu meio social.
Em suma: o docente que reflete sobre seu próprio papel, que transforma sua prática (modificando a práxis), visa fazer de seu educandos sujeitos autônomos. A autonomia do educando não provém unicamente das escolhas dele mesmo, mas de uma decisão do professor de fazer da sua prática pedagógica um ato responsável, político, libertador.
"Um bom pensamento nasce como uma
pipoca que estoura, de forma inesperada e imprevisível."
Rubem Alves
Em suas reflexões sobre a pipoca e seu significado filosófico, Rubem Alves compara o nascer de um pensamento ao estouro do milho - quando nos damos conta, já está ali, pronto para ser saboreado. É repentino.
Nossa mente é como uma panela cheia de milhos esperando a hora de pipocar. E com a temperatura certa, uma ideia pipoca aqui, outra acolá... nossos pensamentos brotam como pipoca quente da panela, basta que deixemos acontecer.
Além dos pensamentos que são como pipoca, nossas próprias vidas são como os milhos que aguardam pelo estouro. A lição que o poeta deixa é que sempre podemos ser diferentes do que já somos. Podemos ser mais, melhor. Podemos nos transformar como o milho que vira pipoca. E o fogo que nos transforma pode ser uma dificuldade da vida, um desapego, uma desilusão... mas também pode ser uma decisão.
Se entendo que sou milho, porque não vou me deixar virar pipoca?
Por que continuar presos a concepções antigas e a um personagem que não faz suas ideias acontecerem se sabemos que mudar é (sempre) possível?
Por mais experiência e por mais conteúdo teórico que tenhamos, mudar o ponto de vista é positivo e traz crescimento. Principalmente quando nos deparamos com concepções que não tem uma definição única, que exigem de nós flexibilidade para aceitar a diversidade.
Abrir nossa mente para novas visões é um caminho para a transformação.
Pautados na mensagem central do vídeo assistido (disponível no post anterior), entendemos que a chave para a compreensão do que é, de fato, o currículo (se é que há uma chave...), reside na sua polissemia, seus múltiplos sentidos, sua relação intensa com o que é vivencial e cultural. Desse modo, não há uma única compreensão ou um conceito consensual.
É preciso conhecer a variedade de sentidos que o currículo incorpora para nos aproximarmos do seu significado. É preciso considerar as contradições que o cercam e o formam.
O movimento dialético do currículo traz o individual e o coletivo, a teoria e a prática, o permanente e o provisório para travar uma conversa. As antíteses nos são apresentadas como parte da resolução desse quebra-cabeça e não podemos, ingenuamente, escolher "ficar de um lado" ou de outro. Ficamos com os dois lados, olhamos para ambos com o mesmo cuidado e a mesma atenção.
O currículo é uma rede de contrapontos que se complementam para formar um todo. Será que somos capazes de reconhecer o todo, se as muitas (e complexas) partes ainda nos são um mistério?
A leitura do primeiro capítulo do livro "O Currículo - reflexões sobre a prática", de J. Gimeno Sacristán, levantou facetas diversas sobre o entendimento do que é o Currículo.
Quando conectamos tal conteúdo com o vídeo de Chimamanda Adichie (que segue neste post), produzimos uma síntese das ideias que nos vieram à mente.
O
conceito de currículo é algo realmente muito difícil de ser definido devido às
diversas vertentes a que ele se destina no âmbito educacional, social,
econômico e político. No entanto, essas vertentes são desconhecidas no que diz
respeito à ideia que a grande maioria das pessoas fazem sobre o currículo. O
entendimento popular de currículo é de que ele representa uma simples
organização de atividades e conteúdos escolares, um conjunto de experiências a
serem vividas pelos alunos e um conjunto de obrigações da escola para
proporcionar essas experiências a esses alunos, enfim, se limitam a um
entendimento técnico sobre o significado de currículo, isso ocorre porque as
pessoas que pensam dessa forma não têm conhecimento sobre as diversas áreas em
que o currículo está interligado e que dão origem aos seus significados. Essa
falta de conhecimento sobre o papel do currículo caracteriza o que podemos
chamar de “história única”, porque uma ideia sem o real conhecimento dos
fundamentos da mesma acabam gerando estereótipos que implícita a verdadeira
essência dessa ideia.
O
currículo se revela em atividades e obtém significados a partir delas.
Atividades essas que derivam de tradições, valores, crenças enfim provém da cultura
e resiste a mudanças quando uma proposta metodológica alternativa pretende
instalar-se em condições já dadas. Temas intimamente ligados a compreender o
funcionamento da realidade são sugeridos pelo currículo. Podemos afirmar
que não existe processo de ensino aprendizagem sem conteúdos de cultura; o
conteúdo cultural é a condição lógica do ensino.
O
currículo se apresenta no ambiente escolar como um projeto cultural, social,
politico e administrativo e este se torna realidade dentro das condições da
escola e de como ela esta configurada.
Como
podemos observar o currículo é algo acima de tudo cultural, e estar aberto
apenas para essa cultura local nos impregna de “histórias únicas” sobre grupos,
instituições, países, pessoas...
Acredito
que o objetivo de todo profissional da educação é formar cidadãos críticos e se
não nos libertarmos dessas histórias únicas, para então podermos reconquistar
um paraíso as histórias só servirão para privar-nos de conhecer o outro e de
aprender com o outro e nosso alvo dificilmente será alcançado.
Um
professor que não esteja disposto a ouvir aquilo que o aluno tem a dizer
sobre si mesmo muito provavelmente irá se orientar pela “história única”
que ele conhece acerca desse aluno e, sem dúvida alguma, desprezará grande
parte das experiências que tal indivíduo adquiriu ao longo de sua vida, e
desprezar essas experiências é privar-se de conhecer o outro, de acessar o
universo do outro, é privar-se de aprender com o outro.
A
realidade das práticas escolares é permeada de influências, como já afirmamos
anteriormente. Podemos falar, ainda, da influência da academia na escola
básica. Essa força do academicismo se refere, principalmente, à divisão
do ensino em disciplinas específicas. Esse aspecto traz como orientação central
ao currículo um apoio maior em CONTEÚDOS do que em aspectos PEDAGÓGICOS. Uma
perspectiva dita experimental surge, então, colocando como alternativa
(essencial) que o currículo ligue-se às EXPERIÊNCIAS DOS SUJEITOS, que recrie
as culturas vivenciadas por professores e alunos e demais atores do meio
escolar. “O importante do currículo é a experiência”, defendia Dewey (1967).
Outra
vertente que trouxe influências ao modo de pensar o currículo vem de uma
perspectiva mais tecnicista e burocrática. Nessa visão, o currículo é
visto como uma responsabilidade profissional e, mais ainda, como um objeto de
gestão. As dimensões culturais, sociais e históricas do currículo são deixadas
de lado e a teoria curricular passa a ser um instrumento de racionalidade e
melhoria de gestão.
Tyler
e Johnson são dois autores que propõem uma teoria do currículo baseada em
outros aspectos além dos técnicos. Para o primeiro, o currículo é composto das
experiências de aprendizagem planejadas pela escola a fim de se alcançar certos
objetivos educativos. Já o segundo defende que o currículo é o conjunto de
objetivos que se quer alcançar – os meios de fazê-lo não são preocupações
curriculares.
Fica
claro que, assim como nas discussões anteriores, surgem diversas concepções de
currículo ao longo de nossos estudos. A importância de conhecê-las e refletir
sobre elas não está na intenção de eleger uma concepção vencedora, mas
justamente no intuito de ampliar nossa visão sobre esse tema. O currículo, com
seus sentidos múltiplos, tem histórias diversas. Não podemos nos prender a uma história
única de currículo e deixar de lado as ideias distintas que se apresentam.
Importante
concluir que, segundo o autor, o currículo deve vir como uma possibilidade de emancipar
professores e alunos. Não se deve pensar em utilizar o currículo como uma forma
de tolher professores e subjugar alunos, mas sim como um caminho emancipatório.
Para que isso ocorra, ele deve ser entendido como uma práxis que, segundo
Grundy (1987), reflete sobre si mesma, ocorre em condições concretas e não em
hipóteses, que considera o social em que está imerso. É essencial que não nos
prendamos a histórias únicas de currículos como objetos fechados, como
organização de conteúdos, como normas e orientações deslocadas e frias. Há um
alerta para que olhemos para essas histórias de currículos como práxis repletas
de vivências e da cultura, como canais da reflexão dos professores e da
comunicação entre ideias e valores dos sujeitos. Stenhouse (1980) defende que
“um currículo, se é valioso, (...) proporciona um campo onde o professor pode
desenvolver novas habilidades, relacionando-as com as concepções do
conhecimento e da aprendizagem”. As teorias curriculares procuram explicar uma
dupla dimensão: as relações do currículo com o exterior e o currículo como
regulador do interior das instituições escolares (p. 53). Para tal, precisamos
nos aventurar em outras perspectivas que não a dominante, que não a imposta.
Precisamos buscar conhecer múltiplas histórias.
Pensar o currículo é pensar num complexo de conhecimentos e experiências relativos à formação do sujeito.
Ele é documental, é vivido, é oculto. Só pode ser compreendido (mas nunca totalmente) em suas dimensões várias: o currículo exige um posicionamento - é político -, é fruto da cultura e da história, é epistêmico.
Na busca de explicar o real, de construir valores e significados, ele caminha, 'errante' que é, na direção do CONHECER.
Há quem pense que o currículo é essa figura formal e previsível, um arquivo de conteúdos. Todavia, deve-se saber que ele não se faz apenas de formalidades... em suas facetas, está presente em tudo o que acontece no seio da escola, nos professores e nos alunos. Ele é prática e reflexão. Práxis.
E como práxis, há de emergir um sujeito (ou muitos) que o faça.
E esses não o fazem como quem segue à risca um manual, mas são os que constroem atos curriculares, todos juntos. Não há criadores ou meros executores, mas sujeitos que conjuntamente realizam escolhas, vivenciam, organizam.
De fato, atuam.
E pensam esse currículo, que é uma longa (e sinuosa!) trajetória que conduz ao conhecimento da nossa intricada realidade.